Acredito que as coisas da modernidade ou da pós-modernidade foram criadas para não serem entendidas. Algumas são de fácil compreensão, outras se mostram com algum grau de dificuldade e outras são incompreensíveis, mesmo. Nessa categoria de pouca ou nenhuma compreensão eu coloco com muita certeza o celular: aparelho mais do que necessário nos dias de hoje; útil e essencial para algumas operações imediatistas, multifuncional e compacto para tudo o que faz, porém se der zica, nem o Papa dá jeito. São as coisas do novo tempo…
Vinha caminhando bem com meu Galaxy, sem problemas, fazendo meus serviços bancários, minhas fotos e meus contatos até que começaram a me importunar listando as vantagens do iPhone, porque as fotos, porque a velocidade, porque os recursos, porque os arquivos. Acabei achando que tinha uma máquina de escrever Remington e que chegara a hora de trocar para um melhor.
Sinceramente pensei que estava carregando a agenda de 2001 ou um diário de anotações, mas teria que me adaptar com o majestoso e fantástico iPhone. Até pensei que ao acordar ele me diria bom dia, perguntaria se dormi bem, já que era tão cheio de preciosidades. Mas a própria transferência de dados de um para o outro foi meio confusa e desajustada. Sim, fui a loja e a atendente, que me chamou de “meu bem” e disse que o iPhone tem outra maneira de fazer esta transferência e de armazenar (desordenadamente).
Não respondi nada porque o que poderia falar para uma pessoa que nem conversar sabe? Não sabe diferenciar as relações profissionais das pessoais? E que não entende da tecnologia do aparelho e quer dar palpite? Bem, vamos parar as críticas por aqui, porque a situação é outra. A coisa ficou chata quando acordo com o celular vibrando uma madrugada destas. O aparelho não parava e não atendia nenhum comando.
Claro que achei estranho, mas vai que é coisa do iPhone e tudo estaria certo. Então, ao amanhecer, fui manuseá-lo e ele havia se desligado automaticamente. Ao acioná-lo, percebi que meus aplicativos não estavam mais ativos, o que me causou apreensão. Não houvera nenhuma perda, mas tive de baixá-los novamente e confesso que estranhei muito. Contatei a loja (aliás, “store”) onde o comprei, fui ate lá e meu aparelho, depois de uma varredura, foi considerado perfeito, o que me alegrou bastante.
Passaram-se os dias e eu feliz com meu celular sem sonhar que ele me pregaria outra peça: sumiram cinco conversas. Sumiram as conversas de contatos com quem eu mais me comunicava, desde o início delas, há seis anos, até aquele exato momento. Corri na “store” mas nada podia ser feito, porque as mensagens foram apagadas inexplicavelmente. Inclusive gerou um ar de desconfiança de eu ter apagado todas elas, mas havia registro de momento exato do sumiço o que era impossível que eu fizesse as cinco operações ao mesmo tempo…
Com o Galaxy nunca passei por isso, mas agora tenho um iPhone!!! Tudo é novo, inclusive as surpresas. Realmente estamos flanando no mundo das tecnologias de última geração, que trazem dúvidas aos novatos e trazem desespero aos meus contemporâneos, pois não é fácil dominar tudo, sempre e cada vez mais.
Enquanto esboço este comentário me pego pensando: é uma queixa? É uma afirmação? É uma constatação? O que você pretende? Pretendo me colocar pensando, buscando entender tantas reviravoltas e tantas incertezas que temos diante de situações desconhecidas e de difícil compreensão para quem não é “expert” nem tem interesse em ser. Na vida do cidadão pacato ele precisa apenas ter dinheiro para adquirir o aparelho desta ou daquela marca e saber as operações básicas para se colocar em contato com o mundo.
Isso é essencial, no momento em que estamos vivendo, onde todos falam com todos de todas as partes do Universo. Entretanto, estamos tão reféns do aparelho celular e da tecnologia que, ao menor sinal de uma pane, ficamos transtornados e afetados pelo imobilismo social: um dia sem celular é um dia sem pertencer a um mundo e contatos imediatos, onde perguntar e responder são ações imediatas, conjugadas e sincrônicas.
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Não conseguir se mostrar presente, nos dias de hoje, é semelhante a não existir. Mais ainda: não garantir a qualidade de pertença à uma raça culta e avançada (ainda que não se saiba de qual cultura e avanço se fale), protagonizando o distanciamento social momentâneo e frio que se finca em nossa Vida. Talvez seja esse o motivo de espanto que se percebe quando alguém pergunta se você tem Facebook, Instagram, Linkedin, Whatsapp, Telegram…estes são o passaporte que garante a Vida em comunidade, mesmo que se fale de uma comunidade virtual.
Não se trata de uma crítica, nem de um elogio. Trata-se de constatações: mais do que nunca estamos reféns da tecnologia: já não vivemos mais sem nosso membro biônico, razão de nossas alegrias e desesperos. O celular, atualmente, é mais importante que nossos óculos, nossas bengalas, nossos aparelhos auditivos. Sim, ele ocupa o papel de uma órtese muito bem elaborada e que nos coloca num mundo que está totalmente dominado pela mais moderna tecnologia. E viva o celular!!!(Foto: Freepik)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Leciona na Faculdade de Psicologia UNIANCHIETA. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.
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