DOR, simplesmente dor

dor

Por mais que procuremos entender, a dor sempre será um conceito subjetivo. Cada pessoa tem uma percepção diferente dela. O discernimento se forma a partir do quanto o indivíduo sofreu e como essas experiências impactaram na vida e relações dele. Mesmo assim, podemos fazer aproximações e garantir que a dor também seja vista e sentida como sofrimento em toda sua abrangência.

Alguns desenvolvem formas de enfrentamento e superam tal desafio atingindo resiliência que, em maior ou menor escala, garantem um estado de vida dentro de certo equilíbrio, favorecendo uma Vida agradável, cheia de emoções que pululam de uma ponta a outra da montanha-russa das emoções, mas fluem sensata e agradavelmente.

Com a dor, temos aquilo que percebemos em vários setores de nossa existência: uma diversidade que passa pela dor física, dor emocional e dor social, cada uma delas com suas características e sintomas e, claro, com seus estragos e fortalecimentos, que variam desde a intensidade que a pessoas sentiu, durante o impacto causador da dor, e em especial, como ele trabalhou em si, com o resultado deste processo.

A dor física tem sua origem em acidentes (propositais ou não), desgastes das peças ósseas ou órgãos, deformidades e/ou doenças que vamos acumulando no decorrer dos tempos. Em sua essência, um médico que execute uma boa anamnese iniciará o processo para balizar o andamento de um tratamento que auxiliará no controle dela e na extinção do processo doloroso, quando for o caso.

Este tipo de sofrimento é facilmente comunicado, sempre referido em sua origem, andamento e encaminhamento. Lembramos que a dor física pode ser o início de uma dor emocional, o que gera certo cuidado e velocidade em busca da solução, além da possibilidade de aplicação de uma terapia ampliada que ataque a causa e a consequência dela, com a ajuda essencial do personagem que reclama deste sofrer.

A dor física sempre indica que algo não vai bem com nosso corpo. Traz forte desarranjo em nossa percepção de bem-estar, sempre que existe demora na solução ou na detecção dos caminhos a seguir até vencê-la. Vemos que este sinal de alerta aponta para um dano anatomofisiológico que nos assusta e chega a levar ao desespero pela sua intensidade e incapacitação.

Em outra direção, temos a dor emocional que que nos conduz à compreensão da forma como as pessoas lidam com suas emoções: algumas são mais talhados para o enfrentamento e revertem o sofrimento em experiências proveitosas para a saúde mental. Já, outros, com menos habilidades psicológicas desenvolvidas ou com uma resiliência pouco desenvolvida, levam tempo e sofrem mais, até que identifiquem a origem e iniciem uma conduta que minimize o sofrer.

Na Psicologia dizemos tratar-se da dor da alma, muito real em pessoas que sofrem decepções, enfrentam mentiras, traições, rompimentos ou a perda de um ente querido. Tal percepção é suficiente para alterar o estado de vida e iniciar um processo dolorido, em que o sofrimento assemelha-se à dor física: rasga por dentro; paralisa; anestesia a alma e a inércia vai se tornando presente, até que um tratamento eficiente e eficaz, com profissionais da Saúde Mental comecem a surtir efeito. Perceber que algo não está bem e que é preciso receber ajuda já deve ser entendido como referência para aqueles que buscam resolver seus problemas pessoais.

Tanto uma dor quanto outra são processadas em nosso cérebro da mesma maneira e ativam as mesmas regiões neurais, o que possibilita ao profissional da Saúde Mental entender que existe alterações e que não são alterações positivas, merecem cuidados. É interessante perceber que a dor emocional pode ser a base de alguns transtornos fisiológicos que, também, causam sofrimento, tais como problemas respiratórios, dor de cabeça, taquicardia, urticárias e outros; esta sintomatologia, quando bem investigada, nos leva, muitas vezes, aos sofrimentos emocionais que, quando controlados e cessados, são responsáveis pela extinção destes males.

Atualmente, diante da velocidade impressa no desenvolvimento de nossas atividades profissionais, acabamos por negligenciar tanto a dor física, deixando-a para uma consulta na próxima semana. O mesmo ocorre com a dor emocional que sempre fica para o segundo plano, aguardando alguma mudança que nunca vem. Esse comportamento de negligência também pode ser visto como uma forma de escamotear e ocultar aquilo que realmente me incomoda. Entretanto, há algo ainda maior e muito mais escondido em nosso interior: a dor social.

A interação vivida, em nosso dia a dia, nem sempre é tão bem resolvida como pensamos ou  representamos ser; aspectos complexos como a percepção de status, respeitabilidade, confiança, acolhimento no grupo  social, percepção de poder, enfrentamentos pessoais (fome, transporte coletivo, habitação, higiene sanitária, por exemplo) são responsáveis por este mal que atinge a uma grande parte de nossa população.

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Não é tão visível, por ser específica de cada um, da percepção de mundo de cada um. E, sendo por demais subjetiva, parece doer menos, parece não ser dor. Geralmente os engajamentos sociais, as atividades em grupos que representam os espaços de pertença fazem com que haja uma melhora no quadro de sofrimento, pois a preocupação pela mobilização e transformação social reforçam o amadurecimento e a resiliência social. 

Tais quadros são duros e difíceis de serem enfrentados, se pensarmos em passar por eles, sem ajuda e sem um acompanhamento de profissionais das áreas de sofrimento em questão. O bom é que hoje temos condições de superar cada um deles com muita assertividade e sabedoria. Saber quando e a quem buscar para nossa cura é o melhor caminho para deixar de sofrer. Sempre.(Foto: Ketut Subiyanto/Pexels)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology.

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