O período pandêmico trouxe um “up” nas reflexões e manifestações acerca da fé, dentro das convicções religiosas de cada um. Até onde a fé do tamanho de um grão de mostarda brotou, de fato, neste ou naquele, não temos como nos certificar. O que conseguimos visualizar são as muitas manifestações, em todos os formatos, inclusive pelo virtual. Nunca se leu tanto “Deus”, “família” e as expressões “bênçãos”, “amém” e “misericórdia”. Sinal que a fé popular está mesmo nas alturas? Ou são palavras vãs?
Podemos começar as indagações pela própria expressão “misericórdia”, que nos deparamos em enxurradas na rede social, Whatsapp, etc. Quem saberia descrever o significado de misericórdia? E a palavra “amém”? Palavras ditas com consciência ou no impulso, no embalo da maioria? Palavras ao vento são como as nuvens que passam e não molham a terra. Não chove, as sementes não germinam. Muitas impressionam pela beleza desenhada no céu ou causam temor pelo volume. Mas não trazem o necessário a terra – a água em forma de chuva. Dessa mesma forma agem milhares, milhões de pessoas. Palavras que embelezam ou intimidam, porém nada acrescentam ao seio social, não ajudam, não transformam.
Palavras vão às alturas, em forma de ordem ou louvor. As massas se rendem aos espetáculos de luzes, da parafernália eletrônica. Assim como a quantidade dominou todos os espaços, o volume – altura – veio a tiracolo. Pelos morros, pancadões e louvores se digladiam, para ver quem ganha nos decibéis. Pelas planícies e no Planalto Central, longe dos pancadões, ecoaram sons mais amenos, mas ainda distantes da profundidade espiritual. Vozes imperativas, vindas de egos do poder do homem e não da harmonia, do equilíbrio universal.
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E as torres se multiplicam, apontando o céu e atingindo tudo em terra. Crianças, pobres, analfabetos, miseráveis. Todo ser humano em algum momento pega um aparelho celular. Olha, ouve, dá atenção e credibilidade ao que o aparelho transmite. E lá no alto daquela serra, onde o silêncio predomina e o sinal do celular não chega, ninguém dá atenção. Porque poucos buscam o silêncio. Poucos entendem as mensagens ocultas no silêncio. Consequências da “viralização” daquelas expressões anteriormente citadas. Expressões que viraram lugar-comum, tornaram-se banais. São como os líquidos artificiais que consumimos. Tem aparência sedutora, sabor, mas não matam a sede. Não fornecem o que nosso corpo necessita. Mesmo assim, as massas se contentam com os adornos, o espetáculo dos palcos e das bordas. Aquela fé açucarada, que ostenta cor berrante e traz alívio passageiro. Sensação de satisfação. Enquanto isso, a mensagem do silêncio, que vem do alto, continua incompreendida, ignorada. Mais ainda, poucos se habilitam à subida. É mais cômodo permanecer enfrentando obstáculos menores pelas planícies.
Podemos assim tirar reflexões de algumas possíveis interpretações da expressão fé nas alturas. Todas essas interpretações são válidas. E, de repente, contemplar a imagem de um pico, uma serra, pode trazer respostas a tantas dúvidas que guardamos. E a partir desse momento descobrimos o quanto desnecessário é ficar repetindo e repetindo palavras de comiseração, autocomiseração… palavras vãs. Sem esquecer os tantos pronunciamentos da palavra Deus indevidamente, cujo objetivo é terreno, “político”, e não espiritual.

GEORGE ANDRÉ SAVY
Técnico em Administração e Meio Ambiente, escritor, articulista e palestrante. Desenvolve atividades literárias e exposições sobre transporte coletivo, área que pesquisa desde o final da década de 70.
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