FRAGILIDADES da saúde mental na pandemia e o equilíbrio possível

fragilidades

Todos estamos cansados de ouvir falar em pandemia, nada mais é novidade nem as novas cepas ou as novas formas de contaminação. Parece que somos cientistas e que estamos estudando e pesquisando exaustivamente sobre o assunto. O efeito do bombardeio de informações tem, também, esse agravante: quanto mais se divulga mais se dessensibiliza a população, o que traz sérios agravantes, podendo dizer que a negligencia pode ser um deles. Todos estamos sofrendo os efeitos da Covid, direta e indiretamente: o confinamento, quando realmente realizado, já nos trouxe sabores e dissabores, gerando fragilidades na nossa saúde mental. Muitas discussões e conflitos foram causados pelo fato das prefeituras adotarem políticas diferentes, sempre balizadas pelas necessidades locais. Estes critérios, nem sempre muito claros, são suficientes para que as famílias e os relacionamentos sócio culturais oscilem em seus julgamentos e em sua aceitação. Ouvimos demais e percebemos controle de menos, por parte dos órgãos públicos, que imputam à população o ônus e o bônus dos efeitos do isolamento.

Com isto, temos cidades fechadas com população cumprindo com seriedade todas as regras propostas, mas temos, também, cidades onde a população oscila entre cumprir e descumprir, flexibilizando mais do que possível cada etapa do isolamento. Em qualquer um dos casos o que ouvimos é que o governo é insensível com a economia local e que muitos comerciantes e indústrias estão “quebrando” pelas regras impostas. Na verdade o que temos é que os impostos apenas crescem, enquanto a produtividade apenas diminui e isso realmente é muito conflitante e dificulta o diálogo entre as facções a favor e contra a política governamental.

Mais do que isso, as coisas tomam rumos obscuros e não se enquadram às regras reais e de urgência causando desencontros e muitas irregularidades, como as que temos presenciado, com números que não correspondem com a realidade, trazendo a desconfiança e desentendimento nos municípios e com os seus habitantes. Quando existe muito interesse envolvido e quando tudo isso se mistura à política partidária, o caos se instala com muita facilidade. Este é o cenário que estamos vendo e vivendo em nosso país. Vamos dormir com 12% da população vacinada e acordamos com 52%. A velocidade estonteante apenas ajuda a aumentar a desconfiança dos mais incrédulos (e dos crédulos, também).

Olhando do alto, nesta perspectiva, fica uma pergunta: onde esse cenário nos afeta? Como ele nos afeta? Então, de maneira lógica e rápida, passamos a perceber o quão alterado fica nosso estado emocional e quanto essa alteração interfere em nossos domínios cognitivo e psicomotor (sim, no espiritual, também). Passamos a desmontar nosso equilíbrio (se ainda o tivermos) e a fazer da desconfiança um atacante fulminante e intensivo, em nossos dias. Talvez este descontrole faça com que muitos se desviem dos controles ou fujam das vacinas. Talvez.

E esse estado alterado se acentua toda vez que nos pegamos diante de compromissos mais reservados e sérios ou em situações em que devemos ter mais decisão ou postura assertiva. Caso estejamos enfrentando problemas de saúde na família, isso passa a ter a envergadura de um grande drama catastrófico, tirando-nos a possibilidade de um raciocínio claro e, pior, de atitudes coerentes e adequadas com as necessidades. Quanto mais sério é o momento, mais somos testados em nossos domínios humanos em desenvolvimento.

A ansiedade e a depressão encontram brechas para se manifestar e confundir nossos intentos; sintomas estranhos e desagradáveis que nos tomam e deixam sem ação nas ocasiões mais inoportunas. Ficamos sem autonomia e perdemos controle total da situação, sem chance de controlar o descontrole que nos toma e transforma nossos dias em algo totalmente confuso e incontrolável. A depressão suga nossas forças e imobiliza-nos com tenacidade.

Percebamos que até mesmo os atletas olímpicos que estão disputando os jogos relataram que, ao mudar o calendário de 2020 para 2021, os primeiros sinais de ansiedade tomaram conta do grupo, de modo a alterar as rotinas e contingências de treinamento e suspender as competições de alto nível. Tais procedimentos mudaram e transformaram as vidas destes superatletas que passaram a conviver com crises de ansiedade e com total imprevisão de um futuro esportivo favorável, apesar de suas preparações impecáveis para a versão 2020.

Interessante notar que muitas foram as queixas e observações feitas por esses atletas, em especial quando eles falam da ansiedade que tomava conta do período que antecedeu a data prevista e os dias atuais: a incerteza do futuro e o quadro social vivido trouxeram algumas consequências ainda sentida, para aqueles que estão em Tóquio, na maior das competições da Terra. Tentando fugir da ansiedade, sem conseguir se planejar para o futuro, a saída foi garimpar meios que pudessem melhorar o estado emocional, de maneira que os treinamentos fossem individualizados e mantidos.

A partir deste início, toda a proposta do treinamento esportivo foi se transformando e se adaptando, de modo que a rotina se restabeleceu fortemente, auxiliando aos atletas a manter sua vida esportiva com produtividade (outro tipo de produtividade, é claro) mas que permitisse chegar aos Jogos Olímpicos em situação de competição, apesar das dificuldades vividas.

Sim, a ansiedade trouxe outras consequências: o medo da contaminação, a incerteza dos resultados, a dificuldade em pensar em recordes ou vitórias frente à equipes que travaram diferentes tipos de preparação, contatos sociais reduzidos à zero, mudanças e adaptações em relação à vida na Vila Olímpica e desfiles de abertura e encerramento, enfim, tudo seria diferente e embalado pela insegurança que despertou o estado depressivo. Atletas relatam depressão em momentos antes da confirmação dos Jogos Olímpicos 2020/2021.

Dito isto, retornemos ao título desta crônica: fragilidade da saúde mental na pandemia. Todo esforço se voltou ao preparo psicológico do grupo de brasileiros que representariam o país nesta competição de alta visibilidade e importância para o Mundo do esporte, que tem conotações políticas e culturais inimagináveis. Os relatos destes super-heróis apontam na direção de um treinamento esportivo diferenciado, com forte conotação psicológica, em especial porque muitos dos melhores profissionais da Saúde Mental, voltada ao Esporte, empenharam seus saberes e suas técnicas pró-preparação psicológica dos nossos atletas olímpicos.

OUTROS ARTIGOS DE AFONSO MACHADO

ONDE E QUANTO AVANÇAMOS

OURO, PRATA OU BRONZE

ROBUSTEZ PSICOLÓGICA

Precisamos estabelecer comparações entre as populações compostas por estes que nos representam em Tóquio e pelo cidadão comum, que trabalha dia a dia ou que se mantém em isolamento, ainda, diante da situação em que o Mundo se encontra. Em qualquer das versões de seres humanos que possamos pensar, uma verdade é certa e precisa ser garantida: somos todos membros de uma sociedade que luta para sobreviver frente a um vírus que não conhecíamos e muda com constância e violência. Tal velocidade de mutação é o que nos deixa perplexos e fragilizados frente o desconhecido e cobra de todos um zelo pela Vida de todos, Nem tamanho cuidado é capaz de nos fortalecer interiormente porque o desconhecido é bem mais forte que tudo.

Entretanto, as regras de segurança e as medidas preventivas, aliadas à vacinação e higiene possibilitam um fortalecimento emocional e uma possibilidade de manter a Vida em compasso de espera, ainda que avançando lentamente e tomando seu rumo em busca de um equilíbrio. Esse é o exemplo daqueles que disputam os Jogos Olímpicos e dos que rumam, ao nosso lado, na esperança de boas coisas, provando que o equilíbrio é possível, conforme veremos em nossa próxima crônica. É possível ser feliz, sim.(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

AFONSO ANTÔNIO MACHADO 

É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.

VEJA TAMBÉM

PUBLICIDADE: SAIBA TUDO SOBRE ESTE CURSO DA ESCOLA PROFESSOR LUIZ ROSA

ACESSE FACEBOOK DO JUNDIAÍ AGORA: NOTÍCIAS, DIVERSÃO E PROMOÇÕES

PRECISANDO DE BOLSA DE ESTUDOS? O JUNDIAÍ AGORA VAI AJUDAR VOCÊ. É SÓ CLICAR AQUI