Documentalmente, pouco é divulgado sobre uma das regiões que inteirou a concepção da atual Jundiaí e de municípios vizinhos a leste e que ajuda a mantê-los, por séculos, tem sido vilipendiada e marginalizada: Hibiturucaia. Seja no século XVII, a exploração pelos europeus dos nativos, africanos e afrodescendentes ou pela exploração da mão de obra assalariada europeia no século XIX (em substituição aos escravizados) que aqui chegaram muitas vezes, em péssimas condições – obviamente, não comparável ao sofrimento daqueles “administrados” e dos sequestrados no continente africano –, sendo objetos para o embranquecimento do país, ação esta, política pública horrenda da época.
As principais e escassas informações a respeito da região de Hibiturucaia, encontra-se nas Sesmarias e nos textos do historiador suíço Walter Gossner. O bairro jundiaiense anterior aos “ítalo-bairros” – Caxambu e Colônia -, que são núcleos posteriores de imigração, recebe atualmente, o nome de Ivoturucaia, uma corruptela de ‘Hibiturucaia’, sendo no passado uma região que ocupava a área entre os rios Jundiaí-Mirim, Jundiaí-Guaçu, Rio Atibaia e o Morro do Jaraguá. Antes da chegada de bandeirantes, entradistas, jesuítas e tantos outros, possuía como habitantes os nativos de origem Tupi-guarani (Bilreiros – Ibirajaras, Cataguases, Guaianases), economia de subsistência com agricultura de mandioca, milho e fumo, também caça e pesca como afirma Gossner (1974),
“É fato conhecido que os aborígenes já tinham o costume de por fogo às matas e aos descampados, para fazerem as suas toscas roças de mandioca e milho, hábito que transmitiram aos colonizadores europeus que, até hoje, tão grandes prejuízos causa ao Brasil”, afirma Gossner.
Apesar de ocuparem a princípio, da mesma forma como seus “conterrâneos” e descendentes do Velho Mundo, uma minoria permaneceu ali estabelecida quando não mais adiantava a procura por áreas mais próximas ao centro da cidade, que levou a criação dos bairros Caxambu e Colônia, “Núcleo Colonial Barão de Jundiaí‟, por exemplo, permanecendo novamente a área apenas para a manutenção da economia e dos tropeiros com população flutuante (devido às colheitas), em grande parte caboclos e afrodescendentes. Aqueles que ali permaneceram ofereciam mão de obra às roças de fruticultura, seguindo parte para as ferrovias, no entanto, sua vinda havia interesses estranhos como o equilíbrio racial e manutenção da mão de obra escrava nas fazendas.
Segundo Gossner, “depois de esgotados os lotes disponíveis na região da Colônia, várias famílias adquiriram sítios na Ivoturucaia. (…) Lá se deram perfeitamente bem com as famílias de origem portuguesa e índia, os Pedroso, de Freitas, Rocha, da Luz, Trigo, etc…”
Ainda de acordo com ele, “[…] no Ivoturucaia os lavradores plantavam, além dos artigos necessários á subsistência, como milho, mandioca, batata doce etc., muitas fruteiras e verduras, para venda nos mercados e nas feiras.” E aos finais do século XIX, a região precisa se adaptar aos novos modelos de produção e transporte,
“Como os habitantes de Ivoturucaia contribuíam para as provisões dos tropeiros, é natural que eles também iam sofrer com o desaparecimento deste secular sistema viário e o surgimento do novo”, explica o historiador.
Com o café, a chegada da estrada de ferro e a estruturação do setor têxtil, o foco passa a ser os arredores da indústria e da ferrovia e mais e mais, esse bairro jundiaiense, segue sua sina de esquecimento.
Ivoturucaia também participava da nova onda. Mas com o depauperamento da terra, decorrente desta cultura intensa, porém erradamente tratada por métodos extensivos, as colheitas iam definhando. A cultura do café, em Ivoturucaia(foto principal) acabou, definitivamente, com a grande geada de 1918, que “queimou” os cafeeiros até a raiz, não só nas baixadas, mas igualmente nas encostas e barrocas, conforme Walter Gossner.
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A cidade de Jundiaí, a partir da primeira metade do século XX, fortalece seu caminho industrial, apresentando, atualmente um dos maiores crescimentos no ramo industrial do país com forte setor de serviços. Mas lá nas terras fidelíssimas: “É provável que ninguém em Ivoturucaia se tenha apercebido do que a sua fartura também tinha chegado ao fim, pois ninguém possuía rádio ou lia jornal”, escreveu Gossner sobre a crise do café de 1929. Para se aprofundar mais, clique aqui.

JOSÉ FELICIO RIBEIRO DE CEZARE
Mestre e doutorando em Ensino e História de Ciências da Terra pelo Instituto de Geociências da Unicamp. Membro da Academia Jundiaiense de Letras. Pesquisador, historiador, professor, filósofo e poeta. Coeditor da Revista literária JLetras. Para saber mais, clique aqui. Redes sociais: @josefelicioribeirodecezare.
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