Nada me surpreende mais do que a inteligência humana. De repente, do nada criamos algo que terá uma utilidade infinita. Diante das dificuldades encontramos saídas que nos conduzem à vitória. Conseguimos nos superar a cada momento de crise. Não se trata de destino, mas de escolhas e, sempre trazendo o novo, ainda que de forma bruta mas que atende às necessidades do momento. Assim está sendo, novamente, neste momento em que nos vemos entre as idas e vindas dos ciclos pandêmicos, que se arrastam, lentamente, esperando pela chegada das vacinas.
Qual a característica do povo, num momento como este? Qual traço é mais evidente e se sobressai, diante do inacabável? Ouvimos falar muito de que o povo está cansado de ficar preso em casa e de ficar recluso, entretanto ouvimos outro grupo, maior que o anterior, dizer que pretende se preservar e viver. Qual a diferença entre estes dois grupos?
Bem, nos afoitos e apressados está a incerteza do futuro. Numa população que não consegue pensar em preservar-se nem preservar seus próximos, o futuro fica nebuloso e incerto: como conviver com um grupo imediatista e inconsequente, que pensa no hoje sem se preocupar com as consequências de seus atos inadequados, colocados nas mãos do destino? Temos visto baladas durante a semana, onde 300 ou 250 jovens sem máscaras curtem a madrugada, no meio de um desastre pandêmico. Isto trará consequências certas, diretas e imediatas.
Nos que esperam na própria residência, relutando por assumir uma pseudoliberdade e uma autonomia ainda inexistente, temos um nível de compreensão e uma esperança em algo novo que vai se construindo aos poucos, entremeando medos e coragens, aspereza e suavidade, alegria e tristeza, mas descobrindo novas formas de viver os cantos da casa, os refúgios íntimos para suportar o tempo que se escorre lentamente. Apesar das dúvidas, estes estão cheios de esperança e suportam o pesado passar dos dias num ambiente sobejamente explorado.
Talvez esta seja a marca desta população que sobreviverá aos rastos da pandemia: a esperança. Não se trata de uma esperança bíblica, mas uma esperança que nosso aparato cognitivo aponta como forma única e absoluta para manutenção da Vida. Nunca, tanto como agora, vivemos de esperança em esperança, reforçando nosso estado de humor, de modo a encontrarmos o equilíbrio entre nossas escolhas, nossas restrições e nossos anseios, sem culpar o destino. De maneira inteligente e adaptada vamos reescrevendo nossa história de dentro de nossa morada, nestes últimos 16 meses.
A autonomia na escolha de roupa, de horário e de espaço para trabalhar ou estudar não substitui a necessidade que sentidos de um abraço real e caloroso, uma visita interessante ou um passeio inusitado. Entretanto, inteligentemente, buscamos outras formas de superação para estas necessidades: ainda que virtual, colocamo-nos frente aos nossos amigos e nossos compromissos profissionais, de modo a mantermos a sanidade mental afinada.
Novamente, sem ser outra vez, a proposta de relacionamento social por meio do ciberespaço e a tentativa de uma vida adequada a virtualidade vai nos ensinando a tornar possível certas habilidades nunca percebidas ou pretendidas: estamos e contato mais frequente com amigos que não víamos desde antes de fevereiro de 2020. Fazemos tudo de nossa casa sem perder tempo com deslocamento, congestionamentos, gastos de combustível. Podemos nos manter atualizados e bem localizados no contexto mundial, se isso for nosso interesse.
Questões paralelas podem ser evitadas sem confrontos diretos e aproximações são sempre possíveis, em dupla, trio ou grupo, dependendo da plataforma que usamos, porém sempre possível dialogar e ver o rosto de amigos ou conhecidos que estão do outro lado do Mundo. Esta é uma das propostas que a pandemia fortaleceu e possibilitou uma rede de apoio que despertou a aproximação (ainda que virtual) de pessoas que já foram próximas: um processo de redescoberta.
Outra mudança foi a percepção da espiritualidade, coisa até então vista com olhares estranhos, visto o fato de estarmos vindo de um período em que vivíamos a religiosidade, sem muita consciência disto. Hoje, pelo medo ou pelo isolamento ou pela necessidade percebemos que existe algo a mais que nos garanta uma qualidade de vida e um bem estar, para além do material. A sensação de segurança e de esperança afloram quando sentimos que a espiritualidade nos responde e nos completa, diante das alterações do dia a dia. Ter fé facilita e estimula o enfrentamento das durezas e as dores das perdas a que estamos nos submetendo. E favorece ao olhar empático e solidário, sem pieguismo e sem falsidade: é real e acolhedor.
Assuntos polêmicos que nos possibilitem investigar, ensaiar e analisar, antes de falar e criticar nos possibilita estabelecer diálogos com um sem número de pessoas que até discordam da gente, mas oferecem seus posicionamentos e não apenas a crítica pela crítica, que é uma forma infantil de reclamar e não oferecer saída. Então, a cada crítica fundamentada, temos oportunidade de rever nosso posicionamento e caminhar numa direção mais segura, sem nos preocupar em recuar ou fixar nossos olhares para uma direção. Eu, pessoalmente, aprendi, na academia, que isso é evolução cultural. Com a espiritualidade isso também é assim. E evolução e destino não se misturam.
Ao estabelecermos contato com pessoas que não comungam com nossos pensamentos e princípios ampliamos nossos olhares para um alvo antes não percebido (e crescemos com aquilo que se enxerga) porém, ser levado a enxergar algo de forma agressiva e conflitante, por pessoas que não querem analisar fatos e verdades, nem querem dialogar, não sabem respeitar a opinião alheia, não facilita avanços nem é saudável, visto que isto se configura como uma alienação ou uma imposição.
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Hoje vemos uma profusão de ações que mudam as cores da sociedade onde temos os anônimos adotando animais abandonados, cotizando com famílias menos favorecidas, atendendo a projetos sociais, assumindo papéis que muitas instituições não conseguem dar continuidade. É o momento em que percebemos que nem tudo está perdido e que existem pessoas preocupadas com pessoas, sabendo traduzir a dor do outro e oferecendo remédio para quem sofre, de uma forma prática, direta e real. Apesar de não ser grande parte da sociedade, já vemos estas transformações acontecendo, aqui e ali. Fatos que nem o destino preveria…
E, no meio destas mudanças e adaptações, sobram dúvidas semelhantes: a pandemia ensinou a humanidade? A pandemia mudou a sociedade? Então, mais uma vez entendo e aponto como respostas que os que eram bons se transformaram em melhores e os que eram ruins estão piores. É desagradável perceber e entender isso, mas é o que nos resta para o momento. Vislumbramos melhoras e pioras, que serão estabelecidas de acordo com a leitura e participação do mundo, que cada um de nós abraçar. É saber aceitar as consequências de nossos atos, como senhores da nossa própria história. O destino não tem nada a ver com isso…(Foto: funyfaz.com)
AFONSO ANTÔNIO MACHADO
É docente e coordenador do LEPESPE, Laboratório de Estudos e Pesquisas em Psicologia do Esporte, da UNESP. Mestre e Doutor pela UNICAMP, livre docente em Psicologia do Esporte, pela UNESP, graduado em Psicologia, editor chefe do Brazilian Journal of Sport Psychology. Aluno da FATI.
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