Atribui-se a descoberta do fogo como uma das principais ferramentas do homem para garantir a sua sobrevivência e adquirir algum tipo de benefício e conforto. Pesquisas indicam que as primeiras chamas teriam sido produzidas pelo homo erectus, no período mesolítico, enquanto alguns pesquisadores indicam o período neolítico, mas de qualquer forma o fogo contribuiu para o desenvolvimento da raça humana. Possibilitou aprimorar a alimentação através do cozimento, propiciou maior segurança através das chamas que intimidavam animais selvagens, iluminava a escuridão das cavernas e tornava o deslocamento mais seguro, representou importante fonte de calor para combater o frio intenso à época, possibilitou que os grupos permanecessem por mais tempo num determinado local, permitindo e influenciando que buscassem novas formas de sobrevivência, como o desenvolvimento do cultivo de plantas comestíveis (agricultura) e criação de animais para consumo (pecuária), enfim, o fogo teve e tem papel importante na história da humanidade e desde então vem sendo empregado nas suas mais variadas formas.

O fogo pode ser definido como uma oxidação rápida de material combustível que produz uma chama e calor. A mistura de gases a altas temperaturas geram a chama do fogo, resultado da combustão. Para que ocorra o fogo é necessário a existência de três elementos básicos: combustível, comburente e calor, formando o chamado triangulo do fogo, ao qual foi acrescentado um quarto elemento, chamada de reação em cadeia. Dessa forma pode-se dizer que a combustão é uma reação química de oxidação, que redunda numa liberação de energia representada pelo calor.A retirada ou inexistência de alguns destes elementos torna impossível a produção do fogo.Essa premissa é utilizada na busca de soluções preventivas de combate ao fogo descontrolado. A fumaça resultante da queima é composta de elementos químicos que prejudicam e contaminam o meio ambiente, representando perigo para a saúde das pessoas. Parte da jurisprudência entende que essa fumaça configura crime ambiental, independentemente de se comprovar o nexo de causalidade, pois que discordar disso seria um atentado contra o senso comum.

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O fato é que o fogo sempre foi utilizado em grande escala nas atividades agropastoris. Na agricultura empregado para a limpeza de terrenos e preparação da área para plantio. Na pecuária, utilizado para a queima e controle de pragas nas pastagens. Essa prática tem perdurado ao longo dos anos e trazido preocupação ao poder público na medida que tem extrapolado o permissível no seu emprego. A doutrina ambiental traz nomenclaturas próprias para cada tipo de manifestação do fogo, fazendo distinção conforme sua área de ocorrência, se em área urbana ou rural. O fogo em área urbana poderá tipificar uma infração administrativa, quando não coloca em risco a vida de pessoas nem patrimônio alheio, como no caso do fogo em terreno urbano. Poderá tipificar crime comum previsto no Código Penal, caso coloque em risco a integridade física ou o patrimônio de outrem. Na área rural, a utilização do fogo na agricultura passa a ser chamada de queimada, a qual é considerada atividade lícita de emprego de fogo de forma controlada, se atendidos requisitos legais do Decreto nº 2.661 de 08 de julho de 1998. Quando o fogo extrapola aquela situação de controle (queimada), passa a ser chamado de incêndio, que pode ser florestal, atingindo vegetação de grande porte ou simplesmente incêndio em mata ou vegetação, conforme o tipo de área atingida.

O incêndio florestal é o que traz maior preocupação, pois que sua potencialidade de causar danos em florestas é muito abrangente. Não só atinge as espécies vegetais nativas, mas como toda a fauna que ali habita. Segundo publicações recentes o Planeta Terra tem cerca de 30% da sua superfície coberta por florestas e o Brasil detém a maior diversidade de espécies endêmicas, chegando amais de 8000 variedades, sendo o incêndio florestal o seu grande perigo de dano, aliado ao desmatamento criminoso. Nesse sentido devem ser priorizadas ações de prevenção à ocorrência do fogo descontrolado, procurando identificar e avaliar riscos existentes. Investir em equipamentos próprios e criação de brigadas de combate a incêndios, com pessoal treinado e preparado para tais ações. Elaborar mapeamento de áreas mais sujeitas a ocorrência de incêndios, identificando origens e causas que geram o perigo de fogo.Integrar demais atores numa só empreitada, identificando competências e atribuições de cada um. Procurar orientar e sensibilizar a população fixa e flutuante dessas áreas de forma a prevenir o incêndio florestal. Elaborar relatórios com indicadores estatísticos para identificação de casos de incêndios, facilitando emprego futuro de ações de combate, bem identificando autores ou infratores delituosos para que sejam orientados ou mesmo responsabilizados por eventual incêndio criminoso.

No aspecto criminal, a Lei nº 9.605/98, traz no seu artigo 41 o crime de incêndio florestal, imputando àquele que provoca incêndio em mata ou floresta, uma pena de reclusão de dois a quatro anos e multa, caso o crime seja doloso, com intenção de provocar o dano e caso culposo, uma pena de seis meses a um ano e multa. Esse artigo guarda semelhança com o artigo 26, letra “e” da Lei 4.771/65 – Código Florestal, revogado pela Lei 12.651/12 – Novo Código Florestal. Assim, o incêndio florestal não mais é considerado uma simples contravenção florestal, mas um crime contra o meio ambiente, apenado com detenção e multa. Vale lembrar da necessidade para a tipificação do delito de que seja comprovada a autoria, materialidade e circunstâncias do crime através provas materiais, depoimentos, laudos periciais indicando o tamanho da área queimada, o tipo de vegetação, que tipo de vegetação se é mata ou floresta, entre outros elementos comprobatórios.

O Novo Código Florestal, no seu Capítulo IX, dispõe sobre aproibição do uso de fogo e do controle de incêndios. No entanto, no seu art. 38 traz situações que são exceções a essa proibição quanto ao uso do fogo em atividades rurais, como nos casos de regiões específicas que empregam tal atividade, desde que previstas em planos de manejo e devidamente aprovadas pelos órgãos estaduais, que no caso de São Paulo, cabe à CETESB conceder essa autorização. Somente ficam liberadas da utilização do fogo para atividades agropastoris, nos casos de agricultura de subsistência e feita por populações indígenas, no cultivo da terra para plantio para consumo próprio. Para que haja responsabilização pelo uso irregular do fogo deve ser comprovado o nexo causal entre a conduta do infrator e o dano efetivo causado ao meio ambiente. O novo Código Florestal determina a criação de uma Política Nacional de Manejo e Controle de Queimadas, Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais.

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A legislação também disciplina a utilização do fogo em áreas agropastoris, dispondo que essa prática sem autorização do órgão ambiental competente, tipifica infração administrativa ambiental, conforme disposto no art. 58 do Decreto 6.514/08, que regulamenta da Lei 9.605/98, com multa de R$ 1.000,00 por ha. ou fração. No Estado de São Paulo, tal situação também está prevista no art. 58 da Resolução SMA nº 32 de 11 de maio de 2010, como infração administrativa ambiental estadual, punida com multa de R$ 1.000,00 (um mil reais) por hectare ou fração de área agropastoril atingida pelo fogo. Ainda que complexa, a legislação ambiental disciplinadora da utilização do fogo é detalhada e se atendida pode evitar consideráveis danos ambientais provenientes de incêndios florestais.

O fogo ainda é muito utilizado como ferramenta eficaz para algumas atividades de natureza rural, porém os seus malefícios devem ser combatidos através do emprego da norma, com orientação e sensibilização das pessoas para a prevenção de incêndios, uma vez que o fogo descontrolado representa enorme perigo de dano para a fauna e flora. Fogo é fogo.

 

FOGOJOSÉ ROBERTO FERRAZ

Ex-comandante da Guarda Municipal de Jundiaí; delegado aposentado da Polícia Civil; especialista e professor de Direito Ambiental.