Marilena: “Câmara estúpida”. Durval: “Político religioso virou moda”

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Anos atrás, as sessões da Câmara Municipal de Jundiaí não eram nada parecidas com as de hoje. Poderiam até ocorrer algumas citações bíblicas. Mas, eram discretas. Marilena Negro foi vereadora pelo PT por 12 anos. Embora o discurso religioso não fosse tão contundente, a ex-parlamentar acredita que foi naquele período que a imposição da pauta de costumes, segundo ela ‘fundamentalista’ começou a nascer e ninguém deu atenção. Durval Orlato, vereador entre 1997 a 2012 também pelo PT, lembra que os parlamentares naquela época eram mais comedidos. A entrevista com os ex-vereadores, lembrando que a primeira sessão deste ano está marcada para o próximo dia 6:

Marilena, a senhora foi vereadora por mais de uma década. As pregações eram uma constante como ocorre atualmente?

Os católicos predominavam na minha época. Eles deram origem aos fundamentalistas que estão hoje no nosso Legislativo. Também havia evangélicos que traziam questões voltadas à religião. Na ocasião, não percebemos o projeto de poder do campo evangélico, poder que vem junto com a liberação para compra de armas, preconceito e discriminação. Talvez tenhamos relevado o fator alienante do discurso religioso evangélico junto aos fiéis. Qualquer pessoa que fale em nome de Deus é o dono da verdade, é aquele que libertará todo mundo. Isto deturpou a política.

Além da pauta de costumes que buscam impor, é uma estratégia para caçar votos?

Sim. É uma estratégia de oportunismo, de sobrevivência política.

Como era fazer política então, Marilena?

Cada mandato tinham questões concretas colocadas e sempre seguiram eixos das políticas públicas, como crianças, idosos, mulheres, portadores de deficiência, plano diretor. Mesmo não conseguindo aprovar projetos relevantes, nunca perdemos os eixos de defesa das políticas públicas. Levamos movimento sociais para debates e fóruns dentro da Casa. Isto era articular política pública, obrigando outros vereadores a participar. Não vemos debate agora. Hoje há uma involução. Temos a política de costumes, os dogmas religiosos, juntamente com a desinformação. Temos de reagir…

Como a senhora avalia o trabalho da Câmara hoje?

A Câmara é sofrível. É triste ver que os vereadores não fazem projetos pela cidade. Aliás, nem conhecem a cidade e as políticas públicas. Os parlamentares não questionam nem o orçamento da cidade. Os mandatos tornaram-se uma coisa personalíssima, com projetos apresentados para chamar a atenção num determinado momento. Os vereadores acabam depondo contra eles próprios por falta de conhecimento. Temos uma Câmara estúpida. Também é lamentável ver quem atuou no campo progressista adotar uma linha mais populista por conta dos interesses próprios.

Marilena, a senhora tem uma religião?

Embora católica me considero cristã na convivência pacífica com todos os credos. Aliás, uma ação muito pensada no PT e que não conseguimos promover na cidade é a construção de um fórum inter-religioso. Temos esse setorial interno que tem atuado bastante em nível estadual…

Durval, o que você pensa do discurso religioso que tomou conta da Câmara de Jundiaí?

As religiões e as pessoas são livres para professar o que creem. Deus age diferente em cada um, portanto são percepções particulares de fé. Na vida profissional, social ou política, os adeptos de diversas religiões convivem no respeito. Assim deve ser numa Câmara Municipal. Uma crença imposta, jamais convence! Delimitar suas atitudes sempre citando a Bíblia, em trechos que convêm, para criar ou julgar alguém pela regra, foi condenado por Jesus. Ele chamava de fariseus quem se dizia ‘cumpridor das leis de Deus’ em público, mas no privado eram grandes pecadores. 

Como era no período em que o senhor foi parlamentar?

Quando fui vereador em Jundiaí (1997 a 2012, alternadamente, por três mandatos) os colegas mais religiosos eram comedidos e mantinham a harmonia com a diversidade de ideias. Se preocupavam mais com suas ações e coerência, não com discursos. Hoje virou moda politico ‘mostrar como é religioso, devoto… quase orientado pelo próprio Deus’, quase que impondo sua crença como a única forma de resolver as coisas.

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No fundo, seria uma estratégia para assegurar votos nos seus nichos eleitorais?

Pelo jeito, grande parcela dos eleitores gosta disso. Mesmo que não signifique que irão atuar bem como vereadores! A fé deve motivar a olhar por todos, inclusive pelos que não creem. Atuar para melhorar suas vidas. É o testemunho que convence, que desperta olhares, não o falatório conveniente! Vivemos tempos complexos e que deseducam o formato de participação social. A religião precisa parar de influenciar a política…

Durval, o senhor tem religião?

Sou católico cristão…(Publicada originalmente em dezembro de 2023)

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